quinta-feira, 23 de julho de 2009

A pedido de uma pedagoga

O material apresentado pela professora divide-se em textos numerados. Na primeira aula, ela trabalhou o texto 1 e indicou a leitura do texto 2. No primeiro deles (de Jaime Pinsky, professor da Unicamp), o autor faz uma análise crítica do papel do professor e da própria educação na sociedade, começando por enumerar opiniões e abordagens equivocadas, ou confusas, como a daqueles que aproveitam a ocorrência de eventos institucionais, como concursos para provimento de cargos e vestibulares, para alavancar vendas de manuais; cita também os que debatem novas formas de acesso à universidade de maneira um tanto irrefletida; menciona a confusão entre as boas e as más instituições de ensino privadas; por último, critica os que veem a internet como verdadeira panaceia para os problemas educacionais. O autor continua sua crítica à nossa sociedade ao falar da perda de valores que antes nos eram caros, como o respeito à sabedoria adquirida pelo passar dos anos. Cita também o fazer capitalista com suas terceirizações indiscriminadas. Outro aspecto mencionado é o fato de que os pais esperam demais da escola, eximindo-se em boa parte de suas responsabilidades como educadores. Jaime Pinsky relembra dois professores marcantes que teve durante sua vida acadêmica. Um deles conseguiu fazê-lo gostar de Machado de Assis, enquanto o outro enriqueceu sua vida instigando-o a criar argumentos, através do estudo, para refutar conceitos mostrados em sala. Por fim, o autor estabelece as qualidades que imagina serem essenciais para um bom professor: cultura, visão crítica, formação humanística e abertura às mudanças. Diz que o bom professor é aquele que educa. É enfatizada, ainda, a função do livro como parceiro do professor na educação de seus alunos.


Sendo este um texto de caráter subjetivo, no qual devo mencionar o que aprendi e não aprendi durantes as aulas, devo dizer que as reflexões feitas pelo professor Jaime Pinsky são bastante válidas no que tange à superficialidade e à hipocrisia existentes no debate sobre a educação em nosso país. Também concordo com suas críticas quanto ao modelo neoliberal de educação e de sociedade. Faço também minhas suas palavras quanto à importância do livro e de seu papel fundamental com fomentador da capacidade crítica dos alunos. Cabe, contudo, uma brincadeira quanto aos termos machadófobo e machadólatra. Parece que, sempre quando tratamos de Machado de Assis, as paixões, negativas ou positivas, costumam aflorar. Essa divisão pró e contra Machado nem deveria existir. Sem dúvida, trata-se de um grande escritor, um figura muito importante para a formação de nossa literatura, se é que posso utilizar essa terminologia. No entanto, parece haver um campo em que são colocados aqueles que não gostam do autor devido à sua incapacidade de entendê-lo. Como se o sujeito fosse maduro intelectualmente ou não pelo fato de gostar ou desgostar de Machado. Tanto é essa a concepção do professor Jaime, que pode-se perceber a sua transformação para machadólatra ao ser influenciado e guiado por um professor. Acredito ser possível ler esse autor estando imune a tais paixões, analisando, ou fruindo, o que nele me desperta interesse e simplesmente ignorando o resto. Dito isto, gostaria de terminar este parágrafo de análise sobre o texto 1 afirmando que, apesar de tê-lo achado, no geral, bastante pertinente, ele não enriquece muito o debate sobre educação. Suspeito que tenha sido escrito de modo despretensioso, talvez para um veículo de grande circulação, com leitores de gostos variados e não especializados no tema. Sua leitura é relevante como abertura para debates, mas não traz realmente nada de novo.


O texto de número 2, de autoria de José Carlos Libâneo, refere-se à construção da identidade profissional do professor e foi abordado detalhadamente no início da segunda aula. Fala dos conceitos de profissionalidade, profissionalização e profissionalismo. Trata-se de uma roupagem interessante para temas já bastante abordados. No que tange à construção da identidade do professor, foi interessante o debate acerca do caráter subjetivo desse conceito, ligado à autoestima, à sensação de sucesso, à remuneração e à formação continuada, conceito visto em detalhes pelo autor. O texto 2 menciona, ainda, as características e diferenças existentes entre saberes e competências. Tanto para mim quanto para outras pessoas na sala, esse debate já pareceu bastante desgastado, principalmente no que tange aos problemas encontrados na vida docente, trazendo, pois, poucas novidades aos presentes.


Em outro momento, a professora mostrou em sala dois métodos distintos de fichamento, os quais parecem ser bastante úteis para a organização das leituras e futura elaboração de citações e referências bibliográficas. Para mim, que não costumo fazer fichamento, mas apenas grifos nos textos, foi uma boa sugestão, apesar de não estar convencido que eu vá conseguir me organizar desta forma.


O texto de número 3, cuja autoria ignoro (talvez por falta de atenção), lança mão de trocadilhos sobre a máxima socrática acerca da ignorância. Aos moldes de um texto de autoajuda, enumera quatro fases para a aprendizagem. Pode ser resumido através do seguinte excerto: “Somos inconscientemente incompetentes na primeira fase, conscientemente incompetentes na segunda, conscientemente competentes na terceira e inconscientemente competentes na quarta fase”. Como já foi dito, o texto lembra bastante publicações de autoajuda quando cria esquemas com número de fases definidas (algo como sete passos para o sucesso ou cinco dicas para entender sua esposa), o que mostra seu caráter esquemático, ainda que ilustre as fases da aprendizagem.


Finalizando a segunda aula, foi mostrado um interessante vídeo sobre educação e a turma foi dividida em três equipes. A professora pediu que lêssemos um texto e colocássemos suas personagens em ordem decrescente de culpa. Não nos foi dito qual seria a culpa em questão (se seria a morte da personagem ou a criação da situação como um todo). O texto também não entrava em detalhes quanto às motivações dos envolvidos nem pormenorizava aspectos espaçotemporais (a não ser a referência a uma ponte, a qual utilizamos como símbolo em nossas análises). O debate foi bastante interessante, tendo o texto como ponto focal. Foi abordada a construção de significados por cada um de nós e o modo como íamos agindo como coautores por meio do olhar individual. A gradação das culpas foi elaborada e comparada ao trabalho dos outros grupos. Sugeri, em tom descontraído, uma possível razão para a ocorrência dos eventos (algo como um possível desfecho para a história). Minha expectativa acerca dos comentários da professora foi bastante grande, imaginando que haveria uma surpresa final, tal como explicações acerca dos eventos. Devo dizer, como aluno, que o ocorrido foi bastante frustrante. Ao invés de especulações acerca do texto, a professora começou a tecer juízos de valor com base nos comentários e observações dos grupos. O que foi dito por nós acabou sendo usado na elaboração de generalizações acerca de nossas opiniões pessoais e valores éticos. Desse modo, quem não colocou o bandido como principal culpado foi rotulado como alguém com valores morais deturpados. Do mesmo modo, o final que contei para a história não foi tomado como uma brincadeira, mas sim como uma visão preconceituosa contra a mulher, como machismo. Esqueceu-se completamente que os valores de um texto não correspondem aos de seu autor e, mais ainda, que o narrador não é o autor. Assim, quando fiz o comentário, não era eu quem falava, mas sim um possível narrador para a conclusão da história. Houve uma confusão primária e desnecessária acerca do que estava sendo dito com base no texto e do que expressava opiniões pessoais do aluno. Nós, como alunos focados em literatura e semiótica, tratamos o texto como ficção e, pelo menos no meu caso, cuidei do exercício como atividade intelectual livre, de onde não seriam depreendidos juízos de valor acerca de minhas opiniões e convicções éticas. Deste modo, não aceito os comentários da professora e gostaria que ela revisse seu posicionamento, não utilizando mais dinâmicas de grupo (pois não penso tratar-se de outra coisa a sua atividade) para avaliar o caráter de seus alunos, visto tratarem-se estas de ferramentas totalmente inadequadas para serem utilizadas como subsídio para conclusões de cunho generalista. O que aprendi no final dessa aula foi a tomar cuidado com o que digo num ambiente que inadvertidamente julguei livre de radicalismos, sectarismos, e propício ao debate intelectual.

A TRAGÉDIA DE ÉDIPO



(Pai e filho conversam na sala de casa)


– Pai?
– Oi, filho.
– Me conta uma história?
– Agora?
– É, pai.
– Qual história, filho?
– Não sei, inventa uma.
– Tá bom. Era uma vez uma menina que andava pela floresta...
– Tem lobo essa história, pai?
– Acho que sim, mais para frente.
– Sem essa de lobo! O senhor já contou um monte dessas!
– Bem, sem lobos fica difícil. Que tal a do Aladim e...
– Hum, hum. Já assisti o filme.
– E se fosse um ogro que vive numa floresta...
– Shrek, pai. Tá tentando me enrolar.
– Putz! Quer dizer, droga! Já que é assim, tem aquela do cara que acorda num banheiro sujo, perto de outro cara que ele descobre, mais tarde, que tem que matar para salvar a...
– Pô, pai! Pegou pesado! Tá falando de Jogos Mortais. Já vi também.
– Como é? Você já assistiu Jogos Mortais? Desde quando você assiste esse tipo de filme?
– Vi não, pai. Me contaram.
– Precisamos conversar...
– Não tem uma história mais normal?
– Pode ser. Tem a de um rei antigo.
– Rei? Parece bom.
– E é. O nome dele era Édipo. Já assistiu a quantos filmes sobre ele?
– Esse eu não conheço não.
– Bem, ele era rei de uma cidade chamada Tebas, na Grécia antiga.
– Tebas?
– Sim. Na Grécia antiga, as pessoas costumavam encenar a história desse rei.
– Como no teatro?
– Exatamente. Você sabia que o teatro surgiu mais ou menos nessa época?
– Hum, hum.
– Pois é. As pessoas faziam uma festa para comemorar a boa colheita.
– E se a colheita fosse ruim, pai?
– Bem, não sei. Acho que eles ainda agradeceriam a Dionísio, para tentar a sorte no ano seguinte.
– O rei era Dionísio ou esse tal de Édito.
– O nome é Édipo, que era rei de Tebas. Dionísio era um deus.
– Um deus? E Deus tem nome?

(O pai, para si mesmo)

– Ainda vou me ferrar!

(Voltando-se para o filho)

– Os gregos acreditavam que existiam muitos deuses. Hoje em dia, nós achamos que só tem um.
– Mas ter muitos não é mais legal?
– Pode ser, mas esquece um pouco isso. O que interessa é que eles cantavam ditirambos e dançavam para comemorar a colheita.
– Diti o quê?
– Eram umas músicas deles lá. Eles matavam também um bode em homenagem a Dionísio.
– Massa!
– O bode não gostava não.
– Dããã, pai! Claro que não!
– Teve também um sujeito chamado Tespis que decidiu fazer o papel do Dionísio pela primeira vez.
– Ninguém tinha tido essa ideia antes?
– Por incrível que pareça, não.
– Tespis é um nome engraçado.
– É sim. Desse ano em diante, quando o Tespis decidiu ser Dionísio, eles passaram a repetir a representação sempre. Com o tempo, eles acabaram esquecendo que a festa era em homenagem a Dionísio e começaram a escrever histórias para teatro.
– Coitado do Dionísio.
– É sim. Talvez os deuses morram quando são esquecidos. A história do rei Édipo vem depois dessa época, quando já havia grandes escritores fazendo peças.
– Peças?
– Sim, é o nome das histórias que passam nos teatros.
– Ah! Mas o senhor vai contar a história do rei ou não?
– Vou sim, seu apressado. Édipo era filho do rei Laio e da rainha Jocasta.
– Gostei dos nomes.
– Antes do Édipo nascer, seus pais foram a um oráculo.
– O que é oráculo?
– É um lugar onde existe uma pessoa que fala com os deuses e pode dizer o seu futuro.
– Irado! Existem oráculos hoje em dia, pai?
– Acho que o mais próximo disso é o Google!
– Fala sério, pai! O Google não pode dizer o meu futuro.
– Quem sabe daqui a algumas versões... Voltando à história, o oráculo disse para o rei e a rainha que o filho deles iria matar o pai e casar com a mãe.
– Credo! Jogos mortais é fichinha perto disso!
– Para você ver... O pior não é isso. O rei Laio, para evitar que acontecesse o que o oráculo disse, manda matar o filho.
– Que covarde!
– É, acho que não foi a melhor opção. Mas o rei estava tentando fugir do seu destino.
– E ele conseguiu?
– Deixe-me continuar a contar! O rei entregou o menino a um pastor, que deveria deixá-lo amarrado para morrer num local bem feio. Os pés do menino foram furados. Édipo, aliás, significa pés inchados.
– Pô, pai, sacanagem!
– Olha a boca! O pastor teve pena do menino e entregou-o a um colega.
– Acho que já vi isso antes.
– As coisas se repetem, filho. O outro pastor levou o menino para o rei de Corinto, que se chamava Pôlibo, e sua mulher, Mérope.
– Quanto nome estranho!
– Citroelson não é melhor e eu já conheci um.
– Coitado!
– Traumatiza, sabe? Bem, o rei Pôlibo e sua mulher decidiram criar o menino sem que ele soubesse de onde veio.
– Ele não sabia que era adotado?
– Não, até que um dia um bêbado falou que ele era filho adotivo, então Édipo foi consultar o oráculo para saber sua origem.
– Era o mesmo oráculo?
– Esse era o de Delfos. O outro, eu não sei. Não importa, o oráculo disse que ele mataria o pai e casaria com a mãe, mas não disse se ele era filho do rei Pôlibo ou não.
– Que confusão!
– É verdade. Sem ter certeza se era adotado ou não, Édipo vai embora para que a profecia não acontecesse.
– Sofre um bocado esse Édipo.
– Isso não é nada, mas não adiantemos os fatos. Édipo em fuga passa perto de Tebas e, numa encruzilhada...
– Encontrou um lobisomem.
– Não. Na verdade, não sei se lobisomens já existiam naquela época. Édipo encontrou um homem idoso num carro, seguido por criados. Esse homem o ofendeu, mandando que saísse da estrada, e um de seus criados acertou umas pancadas em Édipo. Este reagiu e matou o homem do carro e seus criados, menos um, que saiu correndo.
– Fugiu, o covarde.
– Foi. Não me lembro se ele volta a aparecer na história. De todo modo, você sabe quem era o homem do carro, morto por Édipo?
– Como vou saber?
– É, não tem como. Algum chute?
– Não.
– Tenta.
– Não.
– Tudo bem. O homem morto era Laio, pai de Édipo.
– Olha aí, pai! Que mundo pequeno!
– Se o mundo é pequeno hoje em dia, imagina como era a Grécia mais de dois mil e quinhentos anos atrás.
– E depois, o que aconteceu?
– Édipo foi para Tebas.
– E ele não sabia que tinha nascido lá, né?
– É. Quando chegou em Tebas, tinha uma Esfinge bloqueando a entrada da cidade.
– Uma esfinge igual à do Egito?
– Sim, só que essa ainda tinha nariz. Ela propôs um enigma para Édipo. Se ele não decifrasse, ela o mataria.
– Qual era o enigma, pai?
– Ela queria saber qual animal tinha quatro patas de manhã, duas de tarde e três à noite.
– E existe algum?
– Sim, o homem. De manhã, na infância, o homem engatinha, usando quatro patas; à tarde, ou seja, depois que aprende a andar, usa duas patas; na velhice, que é a noite do homem, ele usa três.
– Três?
– Sim. Suas duas pernas, mais a bengala.
– Show! O Édipo foi muito esperto.
– É. Decifrou o enigma, tornou-se rei de Tebas e casou-se com Jocasta.
– A mãe dele.
– Exatamente. Eles tiveram quatro filhos: Antígona, Ismene, Polinices e Etéocles.
– Quem é homem e quem é mulher nessa história?
– Antígona e Ismene são mulheres. Polinices e Etéocles, homens.
– Polinices parece nome de mulher.
– Também acho. A verdade é que Édipo foi um grande rei, mas os deuses, sabendo que ele casara com a mãe e tivera quatro filhos que eram seus irmãos, decidiram castigar Tebas. Eles lançaram uma peste que começou a dizimar os habitantes e acabar com as colheitas.
– Uau! Essa história tem muita ação, pai.
– Exatamente, filho. Aliás, o sábio Aristóteles comenta sobre isso em um livro.
– Quem é esse Aristóteles? O que ele tem a ver com o Édipo?
– Aristóteles foi um sujeito muito inteligente, que pensava sobre muitas coisas, entre elas, o teatro grego. Ele diz que uma peça como essa do Édipo acontece com os personagens em ação no momento presente. Isso dá vida ao espetáculo e acontece muito nos filmes que você gosta.
– Ah! Os filmes de ação.
– Exatamente, mas não apenas nesses. Ocorre na maioria dos filmes feitos nos Estados Unidos.
– E naqueles filmes que a mamãe gosta?
– Aqueles são filmes europeus. Alguns os chamam de filmes de arte. Ali é outra coisa.
– Eu acho chato. Não acontece nada.
– É verdade.
– O senhor gosta desses filmes, pai?
– Bem, voltando ao Édipo, Aristóteles diz que a história dele, escrita por outro grego, chamado Sófocles, é a melhor de todas as tragédias.
– Existe tragédia boa?
– Acho que para quem faz parte dela, não. Mas como história, a de Édipo é a mais famosa das tragédias.
– Por quê?
– Um dos motivos é que ela não é contada do jeito que eu fiz agora.
– E como é?
– A peça começa com Édipo, já rei, falando com a população sobre as calamidades que estavam acontecendo em Tebas. O povo pedia que ele fizesse alguma coisa.
– Essa é a parte da peste, né?
– Justamente. Eles queriam que o Édipo desse um jeito.
– E o que ele fez?
– Mandou o cunhado, chamado Creonte, ao oráculo de Delfos.
– Tudo se resolvia com o oráculo naquela época?
– Parece que sim.
– E o que o oráculo falou?
– Ele disse que tudo melhoraria quando o assassino do antigo rei Laio fosse pego.
– Mas não foi o Édipo que matou ele?
– Aí é que está a genialidade do Sófocles. Ele começou pelo final e criou algo como uma história de detetives em que o investigador é o culpado e não sabe disso.
– Muito massa! E complicado também.
– Sem dúvida. A peça mostra a investigação de Édipo até a descoberta da verdade.
– E ele descobre?
– Claro, esse é o fechamento da tragédia!
– E o que acontece quando ele descobre?
– A mãe dele, Jocasta, se mata e Édipo fura os próprios olhos.
– Credo! Nível Jogos Mortais, isso!
– Realmente. É interessante perceber que a ação de furar os olhos praticada por Édipo tem um significado simbólico.
– Simplifica isso, pai.
– Quer dizer que o autor queria dizer alguma coisa através dessa atitude do Édipo.
– Dizer o quê?
– Édipo, quando tinha os olhos bons, não era capaz de ver tudo o que acontecia à sua volta. Era como se fosse cego. Ele fura os olhos meio que para dizer que antes não enxergava e agora, cego, era capaz de perceber a verdade. Furar os olhos de modo a olhar para dentro: esse é o ponto.
– Muito complicado, e triste também.
– Sem dúvida.
– Acontece o que depois?
– O Édipo vai embora e seus dois filhos brigam pelo controle da cidade. O que acontece a seguir é narrado em duas outras peças de Sófocles: Antígona e Édipo em Colono.
– O senhor conta pra mim?
– Agora não. Quem sabe outra hora? Filho, posso fazer uma pergunta?
– Sim?
– Por que você pediu para que eu contasse uma história?
– Bem, a professora está falando de narração e mandou a gente escrever uma em casa.
– Você queria usar a minha história como lição-de-casa?
– Só como inspiração, pai.
– Hum, sei. Você não vai poder falar do Édipo.
– O professor já conhece?
– Com certeza, mas você pode aproveitar alguma ideia.
– Será que eu consigo?
– Só tentando para saber.
– Pai, por que uma história tão antiga ainda é contada?
– Acho que é porque ela trabalha com temas que não perdem nunca a validade. Ou seja, a história é muito boa. Você sabia que ela permaneceu como modelo até há pouco mais de cem anos?
– Não brinca!
– É. Até mais ou menos 1880 esse modelo, chamado aristotélico, permaneceu como referência. Foi um sujeito chamado Ibsen que começou a mudar as coisas.
– E o que ele fez?
– Ele fez com que uma história, que normalmente seria contada em um romance, com um narrador dando várias explicações, pudesse ser transformada em obra dramática.
– Não entendi nada.
– É melhor deixar para lá. Outro dia eu leio para você uma história do Ibsen.
– Será que vou entender?
– Acho que sim. Quem sabe eu mostro também Tchékov e Beckett?
– Quem são, pai?
– Outros caras que mudaram o teatro. O Beckett tem uma peça interessante chamada Esperando Godot.
– O que acontece nela?
– Nada, filho.
– Como assim?
– Não há ação e este é o ponto. Umas pessoas reúnem-se numa estrada, têm umas conversas meio absurdas e ficam esperando esse tal de Godot.
– Quem é ele?
– Não sei não.
– E por que eles estão esperando por ele?
– Também não sei.
– Por quanto tempo eles tiveram que esperar?
– Acho que para sempre. Esse Godot nunca chegou, filho. Godot nunca chegou...

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Assum Preto


Surgiu uma referência a essa música do Luiz Gonzaga na aula de hoje e bateu uma nostalgia de quando eu a ouvia no tape TKR do fusca do meu pai. Era uma das poucas fitas que possuíamos e eu sempre a adorei, bem como a do ABBA. Outra música do Luiz Gonzaga presente na fita era Qui nem jiló, também muito bonita e que despertava saudades de uma namorada platônica de minha adolescência.

Segue a letra:


Assum Preto

Composição: Luiz Gonzaga / Humberto Teixeira

Tudo em vorta é só beleza
Sol de Abril e a mata em frô
Mas Assum Preto, cego dos óio
Num vendo a luz, ai, canta de dor (bis)
Tarvez por ignorança
Ou mardade das pió
Furaro os óio do Assum Preto
Pra ele assim, ai, cantá de mió (bis)
Assum Preto veve sorto
Mas num pode avuá
Mil vez a sina de uma gaiola
Desde que o céu, ai, pudesse oiá (bis)
Assum Preto, o meu cantar
É tão triste como o teu
Também roubaro o meu amor
Que era a luz, ai, dos óios meus
Também roubaro o meu amor
Que era a luz, ai, dos óios meus.